A primitiva igreja erguida neste local era da invocação
de Nossa Senhora da Misericórdia, e constituía o segundo maior templo da Lisboa
manuelina, só ultrapassado pelo Mosteiro de Santa Maria de Belém ou dos
Jerónimos. Foi sede da primeira Misericórdia do país, confraria instituída em
1498 por iniciativa de D. Leonor, irmã de D. Manuel I, e do seu confessor Frei
Miguel Contreiras. A igreja foi destruída pelo terremoto de 1755.
Pela mesma altura ruíra também a igreja que D. Manuel
doara em 1502 aos freires da Ordem de Cristo, conhecida como Igreja da
Conceição dos Freires e mais tarde da Conceição Velha (por entretanto se ter
levantado uma nova Igreja da Conceição na capital), e que foi construída no
lugar da sinagoga da Judiaria Grande. Aquando da reconstrução pombalina da
antiga Misericórdia, todos estes elementos se conjugaram para causar alguma
confusão na história do edifício. A Igreja da Conceição dos Freires ou
Conceição Velha não foi incluída no plano pombalino de reconstrução da Baixa
lisboeta; em vez disso, D. José deu aos frades o local da igreja da
Misericórdia, mandada reedificar ao arquitecto pombalino Francisco António
Ferreira (com colaboração de Honorato José Correia) em 1770, perdendo a sua
invocação original e passando a ser a "nova" Conceição Velha. Assim,
alguns autores de renome viriam a localizar, erradamente, a Sinagoga Grande de
Lisboa na Rua da Alfândega, por via da sua identificação com a destruída Igreja
da Conceição.
Francisco António Ferreira, conhecido como o Cangalhas,
aproveitou o portal lateral, mainelado, duas janelas manuelinas, um baixo -
relevo de Nossa Senhora da Misericórdia, e a capela do Santíssimo Sacramento,
esta já do século XVII, que adaptou a capela-mor. Desta forma alterou-se a
orientação do templo, cujo portal transversal Sul passou a principal, a eixo
com uma capela-mor que era anteriormente uma capela lateral.
A fachada é coroada por um singelo frontão triangular, e
rasgada pelo portal manuelino embutido e pelos janelões. O portal é em arco
redondo encimado por conopial, tímpano com alto-relevo representando a Virgem
da Misericórdia de manto aberto, sob o qual se abrigam vária figuras
ajoelhadas. Entre estas destacam-se D. Manuel e sua irmã D. Leonor e o papa
Leão X. Sob o tímpano o portal desenvolve-se em arco duplo com mainel central,
ladeado por pilastras. Os janelões são igualmente em arco redondo, e muito
semelhantes aos do Mosteiro dos Jerónimos. Contém a habitual gramática decorativa
manuelina, combinando grutescos renascentistas e putti com representações
tardo-medievais e naturalistas e com a heráldica régia (cruz da Ordem de Cristo
e esfera armilar).
O interior é de nave única, com capelas colaterais,
coro-alto e capela-mor rectangular. Aqui se conservam várias esculturas de
valor, talhas, e revestimentos de azulejos e estuques setecentistas. Aquando da
mudança, os freires da Ordem de Cristo levavam consigo uma estátua de Nossa
Senhora do Restelo, trazida ainda da Capela de Belém.
No conjunto, o edifício setecentista é uma construção
projectada com pouca graça e alguma falta de habilidade, com um interior
sombrio e apertado, e valorizada apenas pelos importantes elementos manuelinos
que integra.
Sílvia Leite
Classificado como Monumento Nacional.
Texto retirado da: DGPC
Fotografias de Manuela Videira e Rafael Baptista
(Março de 2019)