Desconhece-se a data de fundação da igreja, bem como da povoação que
serve. A existência de uma ponte desde a época romana, com reformas pontuais na
transição para a Baixa Idade Média, sugere que, desde muito cedo, Cheleiros
tenha sido um ponto de passagem importante, no contexto regional do Ocidente a
Norte de Lisboa. No século XIII, numa inquirição do tempo de D. Afonso II, a
sua igreja é uma das duas mencionadas do actual concelho de Mafra, facto que
aponta para uma organização cristã precoce, imediatamente após a conquista do
território por D. Afonso Henriques.
O edifício que chegou até aos nossos dias não possui qualquer
vestígio de um passado tão remoto. A sua construção ter-se-á dado na viragem
para o século XIV, praticamente ao mesmo tempo que a da igreja de Santo André
de Mafra, com a qual mantém um interessante paralelo estilístico. Em 1304, D.
Dinis doou a povoação de Cheleiros a D. Violante Lopes Pacheco, mulher de D.
Diogo Afonso de Sousa, casal que, ao que tudo indica, patrocinou as obras de
Santo André e em cuja capela-mor escolheu sepultar-se. Terá sido a partir desta
data que se construiu a actual igreja, indicação cronológica que encontra
confirmação estilística na analogia entre os portais principais dos dois
templos. O da igreja de Mafra é bastante mais desenvolvido e monumental, com as
suas três arquivoltas e alfiz de cuidado aparelho, que contrasta com a aparente
singeleza da obra de Cheleiros, de arco único. Em todo o caso, não passa
despercebida a idêntica composição adoptada, sintoma claro de uma mesma
influência e proximidade cronológica.
O portal principal foi realizado numa obra que, ao contrário de Santo
André, possuía nave única. Estaremos, provavelmente, perante uma das poucas
igrejas de carácter paroquial de nave única construídas durante a vigência do
Gótico, esquema planimétrico que parece ter sido adoptado em povoações mais
modestas, e que simplificou o modelo paroquial de três naves.
A igreja gótica não chegou íntegra até aos nossos dias, mercê de
sucessivas alterações e outras tantas actualizações estéticas. Uma das mais
importantes aconteceu na primeira metade do século XVI, altura em que se
substituiu a antiga cabeceira por uma capela-mor de duplo tramo e de feição
manuelina.
Relógio de Sol no telhado da sacristia e fachada principal da igreja.
À semelhança de tantas outras igrejas reformadas no reinado de D.
Manuel (em particular em contexto rural), a campanha quinhentista optou por
actualizar radicalmente o ponto fundamental de religiosidade do templo,
mantendo inalterado o corpo. O resultado foi uma capela-mor profunda mas, mais
importante, com uma ampla entrada, definida por um duplo arco abatido (forma
que expande o espaço em vez do perfil quebrado que restringe), encimado
axialmente por uma esfera armilar. Ao centro da abóbada, num bocete, figuram as
armas da família dos Ataíde, família que detinha os direitos sobre a povoação e
que patrocinou esta campanha. Ainda no portal principal, foi incrustada uma pia
baptismal manuelina, sinal exterior da reforma então empreendida.
O corpo gótico do templo também não chegou até hoje. Presumivelmente
no século XVII (altura de que data o revestimento azulejar da nave), nova
campanha de obras foi executada. Tratou-se de uma empreitada modesta, sem
rasgos arquitectónicos ou decorativos assinaláveis, como o atesta o portal
lateral Sul, de arco recto e com frontal triangular simples. No século XVIII,
adicionou-se a torre sineira, de secção quadrangular e composição superior
claramente barroca, características do período joanino.
Em decadência ao longo do século XIX, o restauro a que foi sujeita,
nas décadas de 40 e 50 do século XX, significou uma assinalável renovação da
imagem do templo. O programa selectivo então efectuado foi responsável pela
supressão de alguns elementos da época moderna, casos do lavabo barroco que
existia na Sacristia (VILAR, 1998, p.375) e, presumivelmente, do órgão que, em
1930, se encontrava em muito mau estado (GANDRA, 1998, p.419).
PAF
Classificado como Imóvel de Interesse Público.
Pia de
água benta manuelina embutida no portal.
Ara
romana integrada na parede.
Texto de retirado ao site do: www.patrimoniocultural.gov.pt
Boletim da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais
dedicadas a Monumentos
nº 48 - Igreja de Cheleiros - Mafra - Junho de 1947
edição - Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes.
Fotografias de C@rlos Baptista
(Abril de 2017)